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Alzheimer: Uma nova chance – Dona Amália

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Olá, netinhos. Tudo bem com vocês?

Eu sou o neto da Vó Amália, mais conhecida na internet como Vó da Pomba, hoje temos quase seis milhões de pessoas que nos acompanham. É muita gente, né?

Muitas pessoas que nos assistem acham que os cuidados com a vozinha são fáceis, que é tudo mil maravilhas, mas não tem nada fácil nisso. Se você cuida ou já cuidou de alguém que tem Alzheimer sabe do que eu estou falando, e aqui em casa não é diferente.  Hoje vou contar um pouquinho de tudo isso para vocês.

Há uns sete anos percebemos alguns comportamentos estranhos da Vó Amália, do tipo, não tinha mais noção de tempo, dinheiro, estava se esquecendo das coisas. Estava bem confusa, então resolvemos levar ela em vários médicos especialistas para saber o que estava acontecendo.

Depois de várias avaliações nos disseram que a vozinha estava com Alzheimer, na hora eu fiquei muito assustado. Alzheimer é uma palavra muito forte, na época não tinha muita informação e a primeira coisa que você pensa é: O que você já ouviu falar sobre essa doença? O que vinha na minha cabeça era que a vó ia ser muito esquecida e iria falecer em breve.

Como assim, minha vó que sempre foi esperta, nunca teve nenhuma doença, está com Alzheimer?  E agora? Como vamos lidar com tudo isso? Começou ali um grande desafio. Eu sabia que Alzheimer é uma doença que não tem cura, não tem manual, e só vai piorando. Ninguém está preparado para isso, mas cada um reage de uma forma. Logo após que saí do consultório assustado e sabendo que a nossa vida não seria mais a mesma. Precisaríamos nos dedicar mais ainda a vó Amália, e tínhamos que estar preparados para isso.

Eu sempre digo: “ninguém nasce cuidador”. E vou te falar, no começo foi muito difícil, o Alzheimer era uma novidade para nós e sem muitas informações, fomos lidando dia a dia, no começo você ainda acredita que ela vai voltar a lembrar, que isso pode se reverter, mas os dias passam e nada disso acontece, você fica bravo porque ela não lembra, rebate as suas repetições constantes, isso vai desgastando você, sua família, e principalmente, a mais prejudicada de tudo isso, a minha vó, que não tem culpa alguma de estar com Alzheimer.

Todo dia é a mesma coisa:

Onde eu estou? Que horas nos vamos embora? Não quero tomar banho! Me leva para casa! Você não manda em mim! Não quero comer! Já escovei os dentes! Quem é você?

– Como assim, quem é você? Eu sou seu neto vó.
– Você não é meu neto, eu não tenho neto!

Acredite, isso doeu muito a primeira vez que ouvi. A vó que sempre me amou, que me conhece desde que eu nasci não saber mais quem sou eu? Isso me deixava cada vez mais para baixo. É triste ver a memória de alguém que você tanto ama indo embora.

Isso ai era só o começo da grande batalha. A pessoa com Alzheimer se torna uma extensão sua, você precisa hidratá-la, dar banho, alimentá-la, exercitá-la e, além de ouvir suas repetições, não pode ignorá-la, tem que estar sempre disposto. Ela necessita de todo o cuidado e atenção, pois ela não se lembra de executar as tarefas mais simples.

Ao passar dos tempos, nada estava bem aqui em casa, andávamos todos estressados, a dificuldade de cuidar de um idoso com Alzheimer é mais um cansaço mental do que físico, não tem quem aguente uma pessoa repetindo a mesma a todo o momento, reclamando de tudo, ou perguntando coisas obvias.

O Alzheimer estava vencendo toda minha família, inclusive eu, mas é claro que eu não iria deixar isso barato. Eu não sabia que a cada dia que passava na verdade era mais um aprendizado para mim, o Alzheimer, acredito que seja a única doença no mundo, que te dá uma nova chance de acertar, logo após que você erra, você terá uma nova chance em breve, e dessa vez tentar fazer diferente, acertar.

Eu sempre brinquei muito com a minha vó, sempre demos muita risada e falamos muita besteira, e, no começo do Alzheimer perdemos um pouco disso, pelo estresse que essa doença proporciona a todos. Mas, eu precisava fazer algo, pelo bem de toda a família. Busquei forças e comecei a lidar com mais bom humor todas as situações que vivíamos todos os dias, comecei a achar brechas, que faziam as ações e resposta delas, serem melhores. Todos os dias são as mesmas coisas, as mesmas dificuldades, e se você consegue fazer um dia ser melhor, os outros também serão.
Descobri que temos que surfar a mesma onda, temos que falar o que eles querem ouvir, não podemos rebater, temos que sempre dar a solução para a suas respostas. Isso com amor e bom humor se encaixa perfeitamente. Sem levar a sério o que a vó fala, e contornando com uma brincadeira ou piada, estava conseguindo recuperar a felicidade da minha vó, e consequentemente a da minha família. Tudo começou a mudar, e eu estava conseguindo enxergar a minha vó como eu enxergava antes da doença, a vó brincalhona e feliz que sempre foi, e não uma vó que tem Alzheimer. Vi que o bom humor era um grande aliado para combater essa doença. Aliás, rir não é o melhor remédio?

Na próxima coluna falo um pouco mais para vocês de como uso o bom humor para driblar as dificuldades de quem cuida de alguém com Alzheimer, tornando o riso uma expressão de amor.

Mas também quero saber de vocês. Conta aqui nos comentários como tem sido a vida como cuidadores?

Beijinhos.

Sobre o autor:

Dona Amália tem Alzheimer, uma doença que não tem cura, e seu mascarado neto que nunca teve sua identidade revelada encontrou no bom humor uma maneira mais leve de levar algo tão triste. Hoje o canal (@vodapomba) é referência em cuidados com idosos, indicado e seguido por médicos, psicólogos e terapeutas que lidam com familiares de pessoas que estão passando pela mesma situação.

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Sobre o colunista

Pacientes, ou familiares dos pacientes, expõem relatos sobre doenças de forma mais próxima, humana e cativante.
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